Alguma coisa naquela quarta-feira não ia bem para o João,
mas teimosia não lhe faltava para enfrentar adversidades.
Tudo fazia crer que havia um claro propósito para estragar o
seu bom-humor.
Estava difícil. Até disseram que o João tinha se levantado
com o pé esquerdo.
Nada normal para quem pulava cedo da cama, como a querer
aproveitar ao máximo o seu dia.
Dinâmico, pelo tanto que tinha a fazer, sempre achava que o
dia deveria ter mais de 24 horas.
Era daquelas pessoas que lamentavam até as horas dormidas,
por considerá-las quase um desperdício da noite.
Não era um homem dorminhoco e se três horas por noite,
apenas, pudesse dormir, bastar-lhe-iam.
Assim começa essa estória, aparentemente repleta de
ansiedade.
Desde cedo, por vocação herdada do pai, aprendera e conviver
com trabalho árduo, sem trégua ou descanso.
Nada o parava: nem o sol ardente, nem a chuva calma ou
tempestuosa que habitualmente caía na devida estação.
E como autêntico interiorano - tanto prevenido quanto
prudente, ora envolvido ora arredio, sempre a urdir feitos e fatos, atento a
tudo e a todos - jamais se descuidava das tarefas que empreendia: diária,
pontual, assídua e diligentemente.
Desde tocar as poucas reses e as poucas alimárias que tinha,
fazia de tudo o que possuía e que estava à sua volta sua constante ocupação.
Alegre, sua característica habitual, ou irritado, nunca
perdia oportunidade de cultivar o bom humor.
Matuto sim, mas sempre alegre.
Daquele pedaço de terra adjacente ao pequeno povoado tirava
o seu sustento: plantando, criando, colhendo e vendendo.
Habilidoso na arte de consertar engenhocas, também as
fabricava para uso no seu labor diário.
Trabalhar, para ele, era uma terapia e o labor diário a que
se propunha rendia-lhe enorme prazer.
João era um homem comum, brasileiro do interior, ciente e
consciente do seu dever e da sua importância para as pessoas e para a vida.
Ou João sou eu ou você ou todos nós, na singularidade das
ações que identificam os homens, no afã da lida ou faina que abraçam?
Tão bem se sentia que poderia dizer-se feliz.
Enfim, findou-se o dia do João, como findavam todos os seus
dias.
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Antonio Moreno, 59 anos, é natural de Colinas/MA. Graduado em
Administração e servidor do TCU desde 1975, atualmente no cargo de Auditor
Federal de Controle Externo, na Semag. Escreveu inúmeros artigos sobre variados
temas, a maioria restritos às listas de discussões de servidores do TCU,
constituindo-se um crítico contumaz das práticas administrativas desvirtuadas.
Apreciador de poesias, elegeu esse gênero como uma de suas leituras prediletas.
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