Ernesto
Guevara [dizem] nunca teria se tornado Che
se [em certa noite de nuvens negras de 3 de setembro
de 1946] não tivesse dobrado à direita
em um beco sem nome a 50 metros da Calle
Corrientes. Ao dobrar, encontrou [segundo os dois únicos relatos a respeito,
ambos (previsivelmente) de videntes] uma garota [de brincos vermelhos e obviamente belíssima] que levou o
[desengonçado] ginasiano a passear por
uma tranquila Buenos Aires.
O Obelisco
lembrou a ela do sacrifício do profeta
da Judeia [segundo ela, tão portentoso quanto inútil]: os perigos do Excesso de
Retidão [disse com seriedade mais sedutora que um sorriso]. Caminharam [ela
virava o rosto ao passarem por um
solitário mendigo] com carinho e tristeza mais profundos que a Aurora
Austral – essa péssima figura de linguagem ele a escreveu no único poema que dedicou a ela.
E sua
imaginação [já ligada à dela] lhe revelou: casariam; teriam sete filhos [nos
tempos antes da pílula]; preocupações e êxtase se seguiram – e a morte, em
algum hospital em La Plata – não tantas décadas depois assim. Os pobres não
teriam seu herói – e não lhes faria falta.
Se tivesse
dobrado à esquerda – mas dobrou à direita. A garota ficou a dez metros [o
suficiente para nunca se conhecerem]. Ele viu um homem pobre [e não virou o
rosto] – e o resto acabou na Sierra
Maestra.
Explicam que
a garota era na verdade aquele, de
rabo e chifres, disfarçado – explicação esta que nunca teve força pois o
próprio Che, ateu renitente, nela nunca acreditaria.
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Este conto faz parte de uma série
de 100 contos denominada NARRATIVAS MULTILINEARES, premiada pelo Edital das
Artes de 2011 da Prefeitura Municipal de Fortaleza. Pode ser encontrada no Blog Avelino – Escritos. Todos os
contos têm um máximo de 1500 espaços.
O auditor Paulo Avelino atua na
Secretaria Regional do Ceará e escreve contos, literatura digital e Direito Administrativo.
É um dos coordenadores deste blog.
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